Advogado esclarece sua tese sobre o caso da prefeita de Bom Jardim

 

Foi grande a repercussão da postagem sobre a declaração do advogado Marcos Coutinho Lobo, de que a decretação da prisão preventiva da prefeita Lidiane Leite é indevida. Reveja aqui.

O advogado encaminhou um e-mail ao Blog do Luis Pablo esclarecendo sua tese sobre a “ilegalidade da prisão” da prefeita. Veja abaixo:

Advogado Marcos Lobo

Advogado Marcos Lobo

Caro Pablo,

Inicialmente esclareço que não sou advogado da Prefeita.

Quanto aos questionamentos das pessoas que cometem no teu blog, apresento alguns esclarecimentos.

Quando cometei o caso o meu compromisso foi apenas com a Constituição da República. Não tenho compromisso com a causa da Prefeita.

Consta do inquérito que uma delegada de polícia, por deliberação própria, via portaria, instaurou inquérito policial para apurar responsabilidade criminal de pessoa com foro por prerrogativa de função sem buscar a autorização do órgão competente para tanto, no caso, o egrégio TRF da 1ª. Região.

Era obrigação da delegada de polícia, quando identificou que a investigada principal era uma prefeita municipal, encaminhar os autos à autoridade competente, conforme inteligência do art. 29, X, da Constituição da República.

Ocorre que somente quase 02 (dois) anos após a instauração do inquérito é que o delegado procurou o egrégio TRF da 1ª. Região, ressalta-se, não para buscar autorização, mas tão–somente para requerer prisões preventivas e buscas e apreensões.

Se é que ainda vale a ordem constitucional do Estado Democrático de Direito e que o Brasil não se tornou um estado policial, resta constatar que o ato de instauração de processo investigatório (inquérito policial) contra uma Prefeita Municipal, sem a supervisão judicial, é inconstitucional, ilegal e teratológico, haja vista a usurpação de atribuição exclusiva do Poder Judiciário.

Explique-se. É que a Constituição da República, no art. 29, X, determina que os prefeitos municipais têm foro por prerrogativa de função e, em decorrência desse preceito, o juízo competente para julgamento atrai para si a competência para autorizar a instauração de investigação criminal contra esses agentes políticos.

Nos processos de ação penal originária por conta de foro por prerrogativa de função a investigação criminal não pode ser instaurada sem a prévia e necessária autorização da autoridade judicial competente. Nesse sentido é o entendimento do egrégio Supremo Tribunal Federal. Vide:

“(…) entendeu-se que, no exercício da competência penal originária do STF (art. 102, I, b, da CF c/c o art. 2° da Lei 8.038/90), a atividade de supervisão judicial deve ser constitucionalmente desempenhada durante toda a tramitação das investigações, ou seja, desde a abertura dos procedimentos investigatórios até o eventual oferecimento, ou não, de denúncia pelo Ministério Público, sob pena de esvaziamento da própria idéia dessa prerrogativa. (…) Ademais, em manifestação obter dictum, asseverou-se que a autoridade policial também dependeria dessa autorização para a abertura de inquérito em que envolvido titular de prerrogativa de foro perante esta Corte (…)” (Pet 3825 QO/MT, Rel. Min. Gilmar Mendes, 10.10.2007)

Consta da decisão do STF o seguinte: “Em outras palavras, se a Constituição estabelece que os agentes políticos respondem, por Crime Comum, perante esta Corte (CF, art. 102, I, b), não há razão constitucional plausível para que as atividades relacionadas à ‘supervisão judicial’ (como é o caso da abertura de procedimento investigatório, por exemplo), sejam retiradas do controle judicial do STF. A iniciativa do procedimento investigatório deve ser confiada ao MPF contanto com a supervisão do Ministro-Relator do STF. A Polícia Federal não está autorizada a abrir de ofício inquérito policial para apurar a conduta de parlamentares federais ou do próprio Presidente da República (no caso do STF). No exercício de competência penal originária do STF (CF, art. 102, 1, “b” c/c Lei n° 8.038/1 990, art. 2 1 e Ri/STF, arts. 230 a 234), a atividade de supervisão judicial deve ser constitucionalmente desempenhada durante toda a tramitação das investigações desde a abertura dos procedimentos investigatórios até o eventual oferecimento, ou não, de denúncia pelo dominus litis” (Questão de Ordem no Inquérito n° 2.411/MT, Rei. Ministro GILMAR MENDES, julgado em 10.10.2007, DJe 24.4.2008).

Daí a conclusão de ser necessário – sob pena de violação frontal aos princípios constitucionais de devido processo legal (formal e substantivo), ao art. 29, X, da Constituição da República, dentre outros dispositivos legais e constitucionais – da autorização prévia do egrégio TRF para instauração de investigação criminal contra prefeito municipal.

Veja-se, também, o entendimento do STJ:

“226054 – PENAL E PROCESSUAL PENAL – AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA – (…) – LEGALIDADE – INQUÉRITO – PROCESSAMENTO – COMPETÊNCIA – FORO ORIGINÁRIO DA AÇÃO PENAL – INDICIAMENTO REALIZADO POR AUTORIDADE POLICIAL – ILEGALIDADE – PRERROGATIVA DE FORO – ART. 129, DO CP – (…) V. NOS CASOS EM QUE O INDICIADO POSSUI PRERROGATIVA DE FORO, CABE O PROCESSAMENTO DO INQUÉRITO JUNTO AO TRIBUNAL QUE DETÉM A COMPETÊNCIA PARA JULGAR ORIGINARIAMENTE A AÇÃO PENAL. VI. (…)” (STJ – APen 290/PR – C.Esp. – Rel. Min. Felix Fischer – DJU 26.09.2005 – p. 159)

Ora, como as investigações realizadas pela Polícia Federal têm por fim apurar responsabilidade criminal de uma prefeita, e não foram previamente autorizadas, sequer supervisionadas, pelo egrégio TRF, nulo de pleno direito todo o inquérito.

Porque todo o inquérito e todas as provas nele produzidas é que deram fundamentos à prisão preventiva, resta viciado todo o processo, a incidir o princípio dos frutos da árvore envenenada.

Sobre o tema, o STF ensina que “(…) A doutrina da ilicitude por derivação (teoria dos ‘frutos da árvore envenenada’) repudia, por constitucionalmente inadmissíveis, os meios probatórios, que, não obstante produzidos, validamente, em momento ulterior, acham-se afetados, no entanto, pelo vício (gravíssimo) da ilicitude originária, que a eles se transmite, contaminando-os, por efeito de repercussão causal.” (STF – HC 93.050-6 – 2ª T. – Rel. Min. Celso de Mello – DJe 01.08.2008).

No TSE o entendimento é que “(…) No exercício de competência penal originária, a atividade de supervisão judicial deve ser desempenhada desde a abertura dos procedimentos investigatórios até o eventual oferecimento da denúncia (…)” (REspe n. 28.981/RN, Rel. Ministro MARCELO RIBEIRO, julgado em 6.10.2009, DJe 6.11.2009). Vide ementa de decisão do TSE que ocorreu no curso do ano de 2012:

“HABEAS CORPUS. NULIDADE DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA. SUPERVISÃO JUDICIAL. PRERROGATIVA DE FORO. CHEFE DO EXECUTIVO. NULIDADE ABSOLUTA. DESNECESSIDADE. COMPROVAÇÃO. PREJUÍZO. CONCESSÃO DA ORDEM. 1. Nosso ordenamento jurídico consagra regra da impossibilidade do trancamento da ação penal por meio de habeas corpus. Permite-se, excepcionalmente, o exame de plano, quando evidenciados atipicidade da conduta, extinção da punibilidade, ilegitimidade da parte ou ausência de condição para o exercício da ação penal tal como prescrevia o art. 43 do Código de Processo Penal, revogado pela Lei 11.719/2008, passando a matéria a ser tratada no art. 395 do mesmo Código. 2. NO CASO, O PACIENTE, PREFEITO À ÉPOCA DOS FATOS, GOZA DE FORO PRIVILEGIADO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO, O INQUÉRITO POLICIAL FOI INSTAURADO SEM A ORIENTAÇÃO E SUPERVISÃO DO TRIBUNAL REGIONAL, ÓRGÃO COMPETENTE CONSOANTE O ART. 29, X, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 3. NO EXERCÍCIO DE COMPETÊNCIA PENAL ORIGINÁRIA, A ATIVIDADE DE SUPERVISÃO JUDICIAL DEVE SER DESEMPENHADA DESDE A ABERTURA DOS PROCEDIMENTOS INVESTIGATÓRIOS ATÉ EVENTUAL OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. Precedentes. 4. Ordem concedida.” (37634-12.2009.600.0000 –HC – Habeas Corpus nº 645 – nova cruz/RN – Acórdão de 01/08/2012 – Relator(a) Min. GILSON LANGARO DIPP -Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 160, Data 21/08/2012, Página 37-38)

Veja-se decisões recentes do egrégio TSE:

“ELEIÇÕES 2012. HABEAS CORPUS. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA. ART. 350 DO CÓDIGO ELEITORAL. PREFEITA MUNICIPAL. INQUÉRITO POLICIAL INSTAURADO POR REQUISIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL SEM SUPERVISÃO DO TRE. ORDEM CONCEDIDA. 1. A instauração do inquérito policial para apurar suposto crime praticado por prefeita depende de supervisão do Tribunal Regional Eleitoral competente para processar e julgar o titular do Poder Executivo municipal nos crimes eleitorais. Precedentes do TSE e do STF. 2. A prerrogativa de foro é uma garantia voltada não exatamente para a defesa de interesses de titulares de cargos relevantes, mas para a própria regularidade das instituições. Se a interpretação das normas constitucionais leva à conclusão de que o chefe do Executivo municipal responde por crime eleitoral perante o respectivo TRE, não há razão plausível para que as atividades diretamente relacionadas à supervisão judicial (abertura de procedimento investigatório) sejam retiradas do controle judicial daquele órgão. 3. Ordem concedida.” (TSE – HC: 106888 SP , Relator: Min. GILMAR FERREIRA MENDES, Data de Julgamento: 14/10/2014, Data de Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 230, Data 05/12/2014, Página 85)

“HABEAS CORPUS. ART. 350 e 352 DO CÓDIGO ELEITORAL. PREFEITO MUNICIPAL. INQUÉRITO POLICIAL INSTAURADO POR REQUISIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL. SUPERVISÃO DO TRE. AUSÊNCIA. 1. Compete ao Tribunal Superior Eleitoral processar e julgar habeas corpus impetrado contra ato praticado por Procurador Regional Eleitoral. 2. Coforme recentemente decidido pelo Tribunal: “A instauração do inquérito policial para apurar suposto crime praticado por prefeito depende de supervisão do Tribunal Regional Eleitoral competente para processar e julgar o titular do Poder Executivo municipal nos crimes eleitorais. Precedentes do TSE e do STF” (Habeas Corpus nº 429-07, relator Min. Gilmar Mendes, de 8.4.2014). Ordem concedida.” (TSE – HC: 9485 MT , Relator: Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Data de Julgamento: 22/04/2014, Data de Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 98, Data 28/05/2014, Página 76)

“ELEIÇÕES 2008. HABEAS CORPUS. CRIME DE CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. PEDIDO DE TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. DESMEMBRAMENTO. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA LASTREADA EM DOIS INQUÉRITOS POLICIAIS. O PRIMEIRO TRAMITOU NO CURSO DO MANDATO DE PREFEITO E O SEGUNDO FOI INSTAURADO DURANTE O MANDATO. AUSÊNCIA DE SUPERVISÃO PELO TRE/MT. NULIDADE ABSOLUTA. ORDEM CONCEDIDA. 1. A tramitação de um inquérito no curso do mandato (IPL nº 99/2008 – instaurado antes da diplomação) e a instauração de outro durante o mandato (IPL nº 413/2009), para apurar o crime descrito no art. 299 do Código Eleitoral supostamente praticado por prefeito, exigem a prévia supervisão do Tribunal Regional Eleitoral, órgão competente para processar e julgar o titular do Poder Executivo municipal nos crimes eleitorais. Precedentes do TSE e do STF. 2. A prerrogativa de foro é uma garantia voltada não exatamente para a defesa de interesses de titulares de cargos relevantes, mas para a própria regularidade das instituições. Se a interpretação das normas constitucionais leva à conclusão de que o chefe do Executivo municipal responde por crime eleitoral perante o respectivo TRE, não há razão plausível para que as atividades diretamente relacionadas à supervisão judicial (abertura de procedimento investigatório) sejam retiradas do controle judicial desse órgão. 3. O entendimento do Conselho Nacional de Justiça firmado em procedimento de controle administrativo – fundamento jurídico que embasou a resolução do TRE/MT – não exclui a regra específica dos inquéritos instaurados contra detentores de foro por prerrogativa de função. A necessidade de supervisão desses inquéritos pelo órgão competente não cria embaraços às atividades de investigação, e sim controle judicial com o objetivo de manter a imprescindível estabilidade das instituições públicas. 4. Ordem concedida para trancar a ação penal em relação ao paciente, sem prejuízo do disposto no art. 358, parágrafo único, do Código Eleitoral.” (TSE – HC: 4085 MT , Relator: Min. GILMAR FERREIRA MENDES, Data de Julgamento: 09/04/2014, Data de Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 87, Data 13/05/2014, Página 65-66)

Estes são os esclarecimentos que faço sobre o as minhas declarações.

10 comentários em “Advogado esclarece sua tese sobre o caso da prefeita de Bom Jardim”

  1. TEIMOSO

    Pronto com esses esclarecimentos à defesa da advogada impetra um
    Habeas Corpus solicitando o trancamento do inquérito ou ação penal e ela fica de boa. Engraçado que a polícia sabe que isso é flagrantemente inconstitucional e não faz o procedimento correto como reza a Constituição Federal, caso parecido com a operação Satiagraha, recentemente considerado ilegal e nula pelo STJ.

  2. pericles

    O posicionamento juridico do advogado em questão está perfeita, só mesmo os neófitos e imbecís para questiona-lo.A

  3. Marcos

    Esse advogado é TOP…a prisão ta toda inlegal

  4. Mario Junior

    esse advogado é top ´para tirar bandido da cadeia. contrate ele para o prefeito de Mirinzal

  5. DOUTOR DA FEDERAL

    COM TODA CERTEZA O FATO DE A PREFEITA NAO TER SE APRESENTADO É UMA ESTRATÉGIA DA DEFESA, QUE JA ENTROU COM HC NO STJ, PREVENTIVAMENTE, TUDO PARA A LIDIANE PASSAR ILESA AO CONSTRANGIMENTO DE SER PRESA.

    MANDOU BEM O DR. MARCOS LOBO AGORA!

  6. VALTER

    interessante é que só lembram que a nossa Constituição deve ser seguida na risca nesses casos. Só a titulo de exemplo tem um artigo que preconiza que dentro de 10 anos da promulgação da constituição (1988) o analfabetismo deveria ser erradicado. Tem outro que fala que o salário minimo deve atender todas as necessidades do cidadão, etc…. e nesses casos não aparece advogado nem ninguém pra se levantar contra……é o brasil……..!!!

  7. junior

    O ADVOGADO MARCO LOGO, ALEM DE INTELIGENTE SABE DA LEI, PARABENS DR. É ASSIM QUE SE EXPLICA!

  8. Henrique

    Agora basta os advogados dela darem um Ctrl C Ctrl V e protocolizar a petição, com as suas assinaturas.

    Essa foi a consultoria mais barata que o Dr, MArcos Lobo já deu (“de grátis”).

  9. Valdeci Almeida

    Chapadinhense porreta, dando aula de direito constitucional para quem deveria saber e não sabe!

  10. Gledson

    Para instauração de inquérito policial contra pessoas detentoras de prerrogativa de foro não precisa a autoridade policial obter prévia autorização do Tribunal competente, precisa, somente, submeter o IP dentro do prazo legal ao Tribunal competente para processar e julgar eventual ação penal. A garantia constitucional do foro privilegiado somente é aplicado em Juízo, após oferta de denúncia, assim, não se aplica a fase pré-processual, quando da instauração de IP contra os detentores de foro privilegiado. No caso em tela, a nulidade do IP instaurado contra a Prefeita se dar pelo fato da autoridade policial nao ter enviado dentro do prazo o feito a Autoridade Judiciária competente.

Deixe um comentário:

Formulário de Comentários